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Turismo Insular: Especificidade

São muitas as ilhas que se projetam globalmente como destinos turísticos, e que são conhecidas sobretudo como tal. Essa projeção muitas vezes é independente da do continente ao qual costumam estar simbolicamente ligados, ou de sua condição administrativa particular (ou seja, se são ou não Estados insulares). Assim, quem visita o Havaí não o faz como escala na sua rota pelos Estados Unidos, e o caráter insular de Malta ou de Chipre certamente passa por cima da sua condição de estado. Apesar de existirem estudos específicos sobre o turismo nas chamadas ilhas “frias”, a bibliografia crítica sobre o turismo insular refere-se maioritariamente a pequenas ilhas em ambientes quentes (ilhas de águas quentes) que podem ser promovidas como destinos de sol e praia.

Esta identificação não impediu a reflexão crítica sobre a existência de uma especificidade na caracterização do turismo em ambientes insulares. Para alguns autores, isto parece mais influenciado pelo mito insular do que pela possibilidade de isolar características específicas do turismo que se desenvolve em ambientes insulares face a outras localidades. R. Sharpley (2012), por exemplo, questiona se as ilhas são destinos populares devido à sua condição geográfica ou porque os serviços que oferecem são mais frequentes nas ilhas. Para este autor, os processos que afetam o turismo em contextos insulares – a conectividade, a migração, o contacto com outras realidades – não são específicos e sugerem que a particularidade turística das ilhas seria mais metafórica do que irreal.

Outros autores, no entanto, recorrem aos fatores socioambientais dos ambientes turísticos para identificar as particularidades que devem ser consideradas na análise do seu desenvolvimento. Estas têm que ver, sobretudo, com dois fatores fundamentais. A primeira seria a vulnerabilidade, sobretudo, dos ecossistemas, limitados na sua própria delimitação geográfica e que, face ao aumento da população e dos serviços que o turismo acarreta, poderia ter por corolário uma sobreexploração dos recursos naturais (McLeod; Dodds i Butler, 2021 ; Hall 2015 ; Orelha 2008). Perante isso, é extensa a bibliografia crítica que tenta identificar fórmulas de resiliência ou otimização que possam garantir uma exploração turística mais sustentável. D. B. Weaver (2017) identifica uma “síndrome da periferia virtuosa” resultante tanto da necessidade quanto do legado, que transforma pequenas ilhas em locais de resiliência e inovação. Em segundo lugar, sobretudo nas pequenas ilhas, sem desenvolvimento industrial anterior à exploração turística, o turismo substituiu uma economia agrária ou de subsistência difícil de manter na era da globalização. Weaver considera o turismo uma fórmula oportuna para o desenvolvimento económico, onde os fatores aparentemente negativos dos contextos insulares seriam transformados em positivos pela indústria turística. Essa monocultura, no entanto, é muitas vezes considerada uma forma de dependência que pode até ser reminiscente do imperialismo e que torna as economias e populações insulares dependentes de fatores que os seus habitantes e os seus governos não podem controlar. Assim, por exemplo, aconteceu com a pandemia de Covid-19 e é levantada a necessidade de estabelecer planos de ação face às alterações climáticas que ameaçariam fortemente os enclaves insulares. Nem todos os habitantes, observa Buhalis (1999), compartilham a riqueza associada ao desenvolvimento do turismo, mas, pelo contrário, a maioria dos habitantes locais participa apenas de empregos secundários e pouco qualificados e remunerados. Ainda mais quando o capital é acumulado pelas grandes corporações e multinacionais do lazer. Por último, há que considerar que Baum (1996) e Baldacchino (2013) se referem a outro fator relevante na especificidade dos enclaves insulares enquanto destinos turísticos e que se prende com uma certa perceção de totalidade que permitiria ter a perceção de estar a visitar “uma” realidade. Assim, por exemplo, parece mais viável visitar Madagáscar do que a França ou a Tailândia, apesar de serem menores em área. Na verdade, este mesmo sentimento favorece a criação de “marcas” turísticas com mais facilidade do que nos destinos continentais, onde, no entanto, também ocorre.

Merce Picornell

Referências:

Baldacchino, G., 2013. Island tourism. In: Holden, A., Fennell, D. (Eds.), A Handbook of Tourism and the Environment. Routledge,. London, pp. 200–208.

Baum, T. G. 1996. “The Fascination of Islands: The Tourist Perspective”, D. G. Lockhart i D.Drakakis-Smith, eds. Island Tourism: Problems and Perspectives. Londres: Pinter, 21-35.

Buhalis, Dimitrios (1999). “Tourism on the Greek Islands: Issues of Peripherality, Competitiveness and Development”, International Journal of Tourism Research, 1(5). 341-358.

Hall, M. C. (2012). “Island, islandness, vulnerability and resilience”. Tourism Recreation Research, 37(2), 177-181.

McLeod, Michelle; Dodds, Rachel i Richard Butler (2021). “Introduction to special issue on island tourism resilience”, Tourism Geographies, 23(3), 361-370.

Oreja Rodríguez, J. R. Et al (2008). “The sustainability of island destinations: Tourism area life cycle and teleological perspectives. The case of Tenerife”. Tourism Management, 29(1). 53-64.

Sharpley, R. 2012. “Island tourism or tourism on islands?”, Tourism Recreation Research, 37(2), 167-172.

Weaver, D. B. 2017. “Core-periphery relationships and the sustainability paradox of small island tourism”. Tourism Recreation Research, 42(1), 11-21.