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Turismo e Mito Insular

Na configuração da imagem turística da maioria dos destinos insulares, a sua condição mítica é fundamental. Os ecos fantasiosos dos seus nomes ou alcunhas para as ilhas ultrapassam a fronteira entre a realidade e a ficção, desde a Ítaca de Ulisses até às Ilhas Afortunadas que alguns quiseram localizar na Macaronésia. Na literatura, as ilhas referem-se a um lugar de refúgio ou a um espaço remoto, natural e desabitado, mesmo quando – como em A Tempestade ou Robinson Crussoe – é realmente habitado. A fantasia do insular cria um fascínio ligado à ideia de alteridade, distância ou separação (Sharpley 2012). O mito insular resultou numa falsificação ou simplificação do significado da própria palavra “ilha”, que remeteria, escrevem Charles C. Lim e Chris Cooper (2008), a uma ideia de fantasia, fuga à rotina e normalidade. Este é o tópico que retrata a ilha como um território pequeno e tropical (Baldacchino 2008), ignorando a diversidade de territórios insulares que não se enquadram na categoria. Segundo David Harrison (2001) essa ambivalência ainda prevalece nas representações contemporâneas, nas quais a ilha é apresentada como uma fuga do frenesim quotidiano e um lugar distante e inóspito. É, ainda, usado na publicidade como uma reivindicação para produtos tão diversos, como champôs, colónias ou refrigerantes. John Gillis (2007: 274) coloca as ilhas entre as “geografias míticas” da cultura ocidental, onde são associadas ao afastamento, à diferença e ao exotismo. A ideia metafórica do insular – explica Pete Hay (2006: 30) – pode mesmo dificultar-nos a recordação da realidade das ilhas, e da sua diversidade. O impulso mítico do insular parece orientar de forma irreversível a conceptualização turística dos enclaves insulares, e condiciona o olhar do turista que, segundo John Urry, condiciona não só as expectativas do turista, mas pode mesmo modificar a paisagem,  ou seja, adaptá-lo ao que o mito vende, exagerando, por exemplo, o que nas Canárias pode assemelhar-se ao Tropical ou criando um locus amoenus verde de relva plantada nos campos de golfe de ilhas mediterrânicas ameaçadas pela falta de chuva durante grande parte do verão.

Mercè Picornell

Referências:

Baldacchino, Godfrey (2008). “Studing Islands: On Whose Terms? Some Epistemological and Methodological Challenges to the Pursuit of Island Studies”. Island Studies Journal, 3: 1. 37-56.

Gillis, John (2004). Islands of the Mind: How the Human Imagination created the Atlantic World. Nova York: Palgrave Macmillan.

Hall, M. C. (2012). “Island, islandness, vulnerability and resilience”. Tourism Recreation Research, 37(2), 177-181.

Harrison, David, “Islands, Image and Tourism”, Tourism Recreation Research, 26(3), 9-14.

Lim, Charles C. (2008). “Beyond sustainability: optimising island tourism development”. International Journal of Tourism Research, 11: 1, 89-103.