“O mundo está repleto de ilhas” (Baldacchino, 2006, p.4). Não será de estranhar que, ao longo das últimas décadas, se tenha verificado um aumento do interesse pelos estudos insulares, atraindo investigadores de diversas áreas disciplinares que, em conjunto, têm sido capazes de promover esta “nova” linha de investigação, desenvolvendo-se, assim, a designada “ciência das ilhas”.
A ciência das ilhas, embora jovem, tem revelado grande relevância nos estudos internacionais, como é demonstrado pelo título editorial da revista Tijdschrift voor Economische en Sociale Geografie: “A chegada da Era dos estudos insulares” (Baldacchino, 2004), proclamando, deste modo, a “maturidade” dos estudos insulares (King, 2010).
Para Young, a ilha é um lugar de segredo e mistério, mas o seu isolamento também condiciona a sua evolução histórica (Young, 1999, p. 2). Neste sentido, a especificidade insular pode estar em correlação com a questão hidráulica? Esta entrada pretende, por isso, dar a conhecer as principais tendências da Hidráulica ao nível da investigação. Nesse sentido, e no que diz respeito aos territórios insulares, o artigo de Paulo Espinosa e Fernanda Cravidão, na “Revista Sociedade & Natureza”, com o título “A Ciência das Ilhas e os Estudos Insulares: Breves reflexões sobre o contributo da Geografia / The Cience of islands and the insular studies: brief point of view about the importance of geography, contem um conjunto de temas a estudar e sobre os quais se deve refletir.
Todas as terras emersas, de maior ou menor dimensão, estão rodeadas por oceanos, pelo que as ilhas ocupam, inevitavelmente, um lugar de extrema importância na vida mundial (Biagini; Hoyle, 1999, p. 1). Há factos que traduzem, de uma forma sintética, o real valor das ilhas a nível mundial, embora os mesmos sejam frequentemente ignorados pela maioria dos investigadores. Segundo Baldacchino (2007), perto de 10% da população mundial, quase 600 milhões de pessoas, vivem atualmente em ilhas, ocupando cerca de 7% da superfície da Terra. Aproximadamente um quarto dos Estados independentes do mundo são ilhas ou arquipélagos. Para além disso, as ilhas assumem-se como identidades e espaços diferenciados num mundo cada vez mais homogéneo, em resultado do processo de globalização.
Apesar do seu valor, os pequenos espaços insulares encontram-se, frequentemente, associados a um conjunto de constrangimentos estruturais, uma vez que “em consequência da sua escala, as pequenas ilhas são limitadas em tamanho, em área de terra, em recursos, em potencial económico e populacional, e poder político (Royle, 2001, p. 42). Assim, não surpreende que da totalidade de países soberanos não inteiramente insulares, somente dois apresentam a sua capital numa ilha, sendo estes a Dinamarca e a Guiné Equatorial, traduzindo uma preferência político-funcional pelas áreas continentais em detrimento dos territórios exclusivamente rodeados por água.
Deste modo, são muitas as dificuldades e potencialidades que podemos encontrar nas ilhas. Por isso, estes espaços possuem uma enorme riqueza ao nível do estudo científico. Lockard & Drakakis-Smith (1997) referem que os temas das ilhas que mais tem atraído a atração dos investigadores inclui, para além da atividade turística, a emigração e migração de retorno, transportes e acessibilidade, recursos limitados, como a água, e políticas de desenvolvimento económico.
Assim sendo, a água foi, desde sempre, um fator essencial no estabelecimento de vida, em geral, e do Homem, em particular. A importância deste líquido fez com que ao longo de milénios fosse verificada uma evolução nas técnicas de transporte para consumo humano (Baptista, 2011).
Apesar desta evolução, verificada ao longo dos anos de existência da raça humana, foi numa história mais recente, principalmente no século XX, que se verificaram os grandes progressos nos sistemas de fornecimento de água, devido à necessidade de responder ao aumento demográfico verificado em todo o globo e ao surgimento de novos materiais, como por exemplo, os polímeros. Também ao nível do projeto notou-se uma grande evolução, devida à descoberta de novas leis hidráulicas, que permitem otimizar as condições de abastecimento (Baptista, 2011).
Na maioria dos casos atuais, os edifícios são alimentados através de uma rede pública que transporta água potável. Existem, no entanto, situações em que o abastecimento predial se faz com recurso a poços. Nestes casos, é necessário proceder de forma a garantir a potabilidade da água (Baptista, 2011).
Na execução deste tipo de projeto são tidos em conta fatores essenciais, como a economia, as condições de aplicação e de utilização, as necessidades de traçado e, também, a constituição química de cada material, tendo sempre em conta a legislação que rege este tipo de sistemas. É com base na otimização dos referidos fatores que são construídas as redes de abastecimento de águas (APA, 2018).
O planeamento das águas visa fundamentar e orientar a proteção e a gestão das águas e a compatibilização das suas utilizações com as suas disponibilidades de forma a (APA, 2018):
- Garantir a sua utilização sustentável, assegurando a satisfação das necessidades das gerações atuais sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades;
- Proporcionar critérios de afetação aos vários tipos de usos pretendidos, tendo em conta o valor económico de cada um deles, bem como assegurar a harmonização da gestão das águas com o desenvolvimento regional e as políticas sectoriais, os direitos individuais e os interesses locais;
- Fixar as normas de qualidade ambiental e os critérios relativos ao estado das águas.
Pelo que ficou descrito, posso afirmar que não faltam razões para estudar esta questão em contexto insular. Independentemente da perspetiva utilizada, a investigação sobre as ilhas revela uma grande amplitude temática, dado que podem ser analisados de diferentes ângulos, podendo a disciplina da Hidráulica contribuir para o estudo das “ciências das ilhas”, em particular no que ao planeamento hidráulico diz respeito.
Sérgio Lousada
References
APA. (2018). Políticas, Água, Planeamento. Obtido de Agência Portuguesa do Ambiente: https://www.apambiente.pt/index.php?ref=16&subref=7&sub2ref=9#
Baptista, F. P. (2011). Sistemas Prediais de Distribuição de Água Fria. Lisboa: IST. Obtido de https://fenix.tecnico.ulisboa.pt/downloadFile/395142730852/Tese.pdf
Baldacchino, G. (2004). The Coming of Age of Island Studies. Tijdschrift voor Economische en Sociale Geographie. V. 95, n. 3, pp. 272-283. DOI: http://dx.doi.org/10.1111/j.1467-9663.2004.00307.x
Baldacchino, G. (2006). Extreme Tourism: Lessons from the world cold water. Oxford: Elsevier, p. 4.
Baldacchino, G. (2007). Introducing a world of islands. In: Baldacchino, G. (Ed.). A World of Islands. Charlottetown: University of Prince Edward Island, Institute of Island Studies, p. 1-29.
Biagini, E. & Hoyle, B. (1999). Insularity and Development on an Oceanic Planet. In: Biagini, E. & Hoyle, B. (Eds.). Insularity and Development: international perspectives on islands. London: Pinter, p. 1.
King, R. (2010). A geografia, as ilhas e as migrações numa era de mobilidade global. In: Fosnseca, M. L. (Ed). Actas da Conferência Internacional – Aproximando Mundos Emigração e Imigração em Espaços Insulares. Lisboa: Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, p. 27-62.
Lockhart, D. & Drakakis-Smith, D. (1997). Island Tourism: Trends and Perspectives. London: Mansell, 320 p.
Royle, S. (2001). A Geography of Islands: Small Island Insularity. London: Routledge, p. 42.
Young, L. B. (1999). Islands: Portraits of Miniature Worlds. New York: W. H. Freeman and Company, p. 2.